sf_CIMG2222aCriado em 1982, o Museu Nacional do Teatro integra atualmente um importante espólio dedicado às memórias e à História das artes do espetáculo. Através das suas colecções, procura desenvolver o conhecimento tanto da história e da situação actual das artes do espectáculo, bem como tratar, conservar preservar, organizar, investigar, documentar e divulgar todas as suas colecções. Para além das importantes coleções representativas da totalidade das artes do espétaculo, o Museu integra também uma Biblioteca com cerca de 35000 volumes. Com a colaboração de Sofia Patrão, responsável pela biblioteca, arquivo e centro de documentação deste Museu, divulgamos a entrevista realizada com José Carlos Avarez, diretor do Museu Nacional do Teatro.

De que forma os sistemas de informação existentes no Museu Nacional do Teatro contribuem para a cumprir a missão deste Museu ?

O Museu Nacional do Teatro é o grande arquivo das artes do espetáculo em Portugal, sendo o seu objetivo recolher, preservar, registar, estudar e difundir as suas coleções, promovendo o conhecimento da história e da actividade contemporânea daquelas artes. A sua missão estratégica é informar, formar, educar e divertir o público que a ele acorre, afirmando-se, de forma clara, como uma instituição de referência na museologia e na história das artes em Portugal. Sabemos que o teatro é uma arte por natureza efémera, que os espetáculos são irrepetíveis, um Museu do Teatro guarda o que fica destes momentos. Como escreveu o Dr. Luiz Francisco Rebello no roteiro deste Museu, o que fazemos é ‘partilhar o sonho que, noutros tempos e noutros lugares, foi de outros’. O teatro convoca muitos conceitos, diversas realidades : o texto, o edifício, o trabalho de atores, encenadores, cenógrafos, luminotécnicos, etc.., a produção do espetáculo (gestão, contabilidade, marketing, etc..), teoria, crítica de espetáculos…É uma arte multidisciplinar que apela a vários conhecimentos e expressões artísticas.

Ora, os sistemas de informação do Museu (de inventário e de biblioteca) são um instrumento fundamental para o tratamento, controlo e estudo de uma coleção tão diversa como a nossa. Dependendo da forma como são utilizados, podem oferecer um conhecimento muito aprofundado do acervo, permitindo o cruzamento da informação (que para nós é fundamental), potenciam o trabalho intelectual que se faz sobre as coleções que se traduz no estudo do acervo museológico e na indexação bibliográfica. Os sistemas de informação são muito importantes também na recuperação de dados de tipo mais fatual – oferecendo informação sobre atores, dramaturgos, companhias, artistas plásticos e outros intervenientes nos espetáculos, datas, apoios financeiros, etc…, que formam a base ou são o ponto de partida de boa parte da investigação nesta área. É através dos sistemas de informação que podemos dar respostas verdadeiramente seguras às questões que se colocam sobre a nossa coleção, desde as mais simples às mais complexas. Gostaria de sublinhar que ao longo dos anos as pesquisas se foram tornando cada vez mais finas, isto é, os temas têm vindo a ‘afunilar’. Por exemplo, já é raro aparecer alguém fazendo uma investigação genérica sobre teatro de revista ou sobre a censura ao teatro durante o Estado Novo. Recentemente começaram a surgir teses de mestrado que se debruçam apenas sobre um único espetáculo e que o analisam com enorme profundidade, ou que colocam uma questão muito específica como, por exemplo, de que forma os artistas brasileiros que visitaram Portugal durante determinada década influenciaram a nossa forma de fazer teatro. Perante realidades deste tipo, já não era possível dar resposta às questões com os catálogos tradicionais e com os conhecimentos dos técnicos, por muito abrangentes que fossem.

É preciso realçar todavia que o tratamento deste género de coleção e o atendimento tão especializado que se requer, torna necessário que os técnicos deles encarregues tenham uma sólida base de conhecimentos – é preciso dominar muito bem as artes do espetáculo e é preciso também dominar de forma muito consistente as coleções do Museu, para além de possuir os incontornáveis, absolutamente necessários conhecimentos técnicos. Só assim é possível ter sensibilidade suficiente para perceber que informação presente no documento tem imperiosamente de passar para o sistema para ser pesquisável e como é que tal deverá ser executado, que adaptações deverão ser feitas sobre sistemas que não foram exactamente desenhados para tratar este tipo de coleção. Só assim os sistemas de informação que possuimos serão uma ferramenta verdadeiramente útil ao desempenho das nossas funções e ao cumprimento da nossa missão.

Outro aspecto importante que gostaria de por em evidência é o seguinte : sobretudo ao nível da biblioteca, nós mantemos um contacto constante com instituições congéneres nacionais, sobretudo com a Escola Superior de Teatro e Cinema, o Centro de Documentação do Teatro Nacional D. Maria II e também com a biblioteca da Sociedade Portuguesa de Autores, mas também com instituições estrangeiras como a Biblioteca e Museo Teatrale del Bucardo e o SIBMAS (Société Internationale des Bibliothèques et des Musées des Arts du Spectacle) – é importante a partilha de conhecimentos quando tratamos informação tão específica, quem fica a ganhar são os nossos utilizadores.

Que relação tem o arquivo com a biblioteca e com a coleção?

A relação é sempre de complementariadade. Frequentemente os nossos utilizadores fazem uma pergunta sem definir o tipo de materiais que querem consultar. A tipologia da documentação a consultar é relativamente secundária, o importante é a capacidade do Museu responder às questões que lhe são colocadas.

Para dar resposta a determinada questão podem ser postos à disposição do investigador todo um vasto conjunto de documentos diversificados como, por exemplo, maquetes de cenário, manuscritos, monografias ou fotografias de cena.

Como é que no MNT se definem as fronteiras entre as espécies que são integradas na coleção museológica, na biblioteca ou no arquivo ?

A documentação da biblioteca é de fácil definição (monografias, publicações periódicas e textos cénicos avulsos dactilografados ou manuscritos que são absolutamente complementares relativamente à coleção de peças de teatro publicadas – esse foi, aliás, o critério para que fizessem parte da coleção da biblioteca). Embora o material da biblioteca integre também as exposições (e existem espécies bibliográficas com características claramente museológicas), há um conjunto de material mais evidentemente expositivo como trajes de cena, maquetes de cenário, figurinos, adereços de cena, fotografias, etc…esse material é integrado no sistema de inventário museológico. Estas peças que constituem as nossas coleções, são emprestadas, as suas imagens são cedidas, etc…, por isso é fundamental a sua introdução no sistema de inventário. O arquivo integra sobretudo manuscritos, mas temos também arquivo institucional como é exemplo o Fundo de Teatro do SPN/SNI. Do ponto de vista da informatização esta é a área que se encontra menos adiantada.

Considera importante trabalhar a interoperabilidade dos sistemas?

É importante trabalhar interoperabilidade dos sistemas tendo em conta as expetativas dos utilizadores, mas temos de ser realistas – isso só funciona quando há normalização e se ela é mais imediata no sistema de biblioteca, nem sempre o foi no sistema de inventário, já que inicialmente, por falta de regras claramente estabelecidas se ofereceu um espaço de liberdade a cada inventariante que resultou num conjunto de algumas centenas de registos algo heterogéneos no seu conjunto que é importante rectificar.

Que outras melhorias gostaria de ver acontecer nos sistemas de informação utilizados pelo Museu Nacional do Teatro?

Em primeiro lugar necessitamos de uma ligação à Internet rápida e fiável, nada será possível fazer de forma verdadeiramente eficiente sem este requisito. E como a questão do acesso à informação, assim como as questões da comunicação e partilha de conteúdos constituem um fator determinante e essencial para o exercício da investigação, seria igualmente interessante facultar zonas de acesso wireless à Internet, designadamente na Biblioteca do Museu.

É também importante que os sistemas consigam integrar as valências da web 2.0. e as suas ferramentas freeware. Desta forma, mais do que melhorias técnicas, podemos proporcionar melhorias na prestação de serviços de informação aos utilizadores. Ao desenvolver aplicações que reforcem a interação com os leitores e investigadores através de ambientes de armazenamento e partilha de conteúdos (como imagens no flickr), ou com a sindicação de conteúdos e distribuição de notícias (RSS feeds). A organização de pontos de acesso à informação e aos recursos de pesquisa personalizada e especializada em áreas do teatro é bastante facilitada.

Procuraremos sobretudo no futuro imediato ter uma presença noutros catálogos e repositórios documentais o que permitirá dar uma visibilidade à coleção do Museu muito para além das suas paredes.

Relativamente ao sistema de inventário Matriz, foi pena não se ter aproveitado a arquitectura da nova versão para incluir também as Artes Performativas no capítulo das supercategorias à semelhança do que acontece na maioria dos museus de arte por todo o mundo. Esta minha sugestão visa tornar ainda mais fácil a implementação desta aplicação numa coleção tão vasta e heterogénea como a do MNT. Seria também útil para outros museus nacionais (Arte Antiga, Música, Arqueologia, Etnologia, Traje, entre outras) que dispõem nas suas coleções de núcleos com origem nas artes do espetáculo.

Que presença tem o Museu Nacional do Teatro na Internet?

Temos a nossa página atrávés da qual se pode aceder ao catálogo biblográfico e ao MatrizNet (que, por sua vez tem uma presença na Europeana), temos uma página de Facebook com cerca de 4.000 “amigos”e uma presença no TripAdvisor.

 

Nota biográfica

José Carlos Alvarez tem 58 anos, é licenciado em Filosofia e pós-graduado em Ciências Documentais e em Gestão das Artes. É director do Museu Nacional do Teatro desde 2001, no qual trabalha há mais de 21 anos. Tem diversos artigos e textos publicados, no domínio das Artes do Espectáculo e na área da Museologia. Coordenou a edição e/ou foi autor de várias monografias e catálogos e foi responsável pela criação da exposição permanente daquele Museu, bem como de 16 exposições temporárias. É membro efectivo do ICOM e da SIBMAS (International Association of Libraries and Museums of the Performing Arts), da qual fez parte do comité executivo entre 2006-08. Em 2009 recebeu, na qualidade de director deste Museu, o Prémio Pro-Autor, atribuído pela SPA.

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