Isabel Costa*

Era uma vez… este texto podia começar assim, porque tem histórias (nem sempre com finais felizes), magia, surpresas, crianças e muito mais…

Contrariamente ao que acontecia até há cerca de 15 ou 20 anos, as bibliotecas deixaram de ser espaços fechados, reservados a meia dúzia de escolhidos e passaram a ser espaços abertos a todos e com múltiplas utilizações (acesso à Internet, empréstimo de livros e outros materiais, ateliers de informática, etc…) mas onde o livro e a leitura ocupam (ainda) um espaço central. Tornou-se um lugar comum dizer que a promoção do livro e da leitura deve iniciar-se o mais cedo possível e daí a oferta de diferentes atividades dirigidas aos mais jovens, como a hora do conto, encontros com escritores, leituras encenadas.

valença2Nos últimos sete anos, a Biblioteca Municipal de Valença tem organizado uma atividade de grande sucesso junto dos mais novos e também dos pais…. a que chamámos  “Histórias em pijama”  em que o principal objetivo era organizar algo um pouco diferente e que mostrasse que a biblioteca continua a ser um lugar mágico, onde podem acontecer coisas diferentes como seja dormir na biblioteca.

Alguns avisaram logo ao que vinham: “eu não vou dormir toda a noite… “ e quase cumpriram a promessa, só adormeceram cerca das 6.30 ou 7.00 horas da manhã, como a Joana que quase teve de ser carregada ao colo até ao carro Já agora, alguns pais também “agradeceram”: aproveitaram para sair, assistir ao espetáculo comemorativo do 25 de Abril que decorria um pouco mais à frente, descansar um pouco das traquinices do costume… como comentava um pai no dia seguinte “isto foi baby-sitting topo de gama”, esqueceu-se do grátis.

Este ano a atividade contou com 26 crianças dos 6 aos 10 anos (infelizmente ficaram em lista de espera cerca de 15) e meia dezena de pais. Teve início às 22.00h do dia 24 de Abril e terminou cerca das 9.00h do dia 25 depois de tomado o pequeno-almoço e arrumados os colchões onde dormiram.

Importa referir que os participantes dormem no meio das salas de leitura, entre as estantes dos livros e os lugares mais procurados são os recantos entre estantes, na sala de leitura de adultos, talvez porque durante o ano é de acesso quase interdito, onde se juntam em grupo de amigos, colegas de escola.

As atividades desenvolvidas, este ano, centraram-se em dois livros ” A arca do não é” e “A noite dos animais inventados”  e daí resultaram trabalhos (por grupos) agora expostos no hall de entrada da biblioteca mas aconteceram também jogos, fez-se um lanche cerca das 24.00 h, dançou-se ao som dos êxitos mais recentes – ficará na memória de todos, o Pedro (6 anos) a cantar a plenos pulmões a canção “Happy” do P. Williams, isto cerca das duas da manhã. O mesmo Pedro que bastante mais tarde confessou andar “cheio de saudades” do pai que foi trabalhar para Angola no início do ano, pequenas histórias e confidências que se foram repetindo ao longo da noite.

Tudo planeado e organizado ao mínimo pormenor pela equipa da Biblioteca Municipal e que terminou sem qualquer acidente de percurso, mesmo tendo em consideração que alguns dos miúdos presentes tiveram de ter uma atenção suplementar (diabetes, alergia ao glúten,…). Claro que enquanto os mais pequenos já dormiam cerca das 3 horas da manhã, os mais velhos juntaram-se a conversar no auditório enquanto a equipa da biblioteca tentava manter-se acordada mas alguns foram vencidos pelo cansaço, como foi o meu caso, cerca das 4.30h da manhã, num dos sofás do hall de entrada.

Como imaginam o despertar às 8.00 h da manhã foi difícil mas como comentava o Tiago (6 anos) “amanhã posso vir outra vez?” os mais jovens estavam prontos para repetir mas  não posso esquecer o ar desolado da Beatriz ou da Fabiana ao despedirem-se de nós porque no próximo ano já não poderão participar ou então da Zara, que devido à situação económico-financeira do país vai emigrar com o resto da família para a Escócia, onde o pai se encontra já a trabalhar.  Mas a história desta biblioteca também se fará com estas histórias, estas gentes… da comunidade que servimos.

Sem querer ser lamecha, terminava dizendo que esperámos com esta iniciativa, que a biblioteca, os livros se tornem para todos os participantes “um amor de toda a vida, um amor para toda a vida”.

* Biblioteca Municipal de Valença

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